Cito,
devagar, um fragmento da canção que não existe, ainda, em lugar inferior às
nuvens neste espaço esconso. Notas laterais, esquecidas do lugar assinalado
pela vigília em tons de vermelho. Semáforo. Paro para duvidar mais um pouco.
Não o conheço, assim de nome estranho em desajeito com os rostos que lembro. Nenhum
tem pescoço que, aqui, encaixe. Não o conheço – juro – assim mo confiaram,
retalhado neste papel secundário, descabido por um rectângulo aceite como
instável no contorno, por mãos em recorte. O movimento extinto pelo sinal
anterior. Desobedeço ao tom? Elevo a reflexão pelo pé-direito, espartilhado por
coisa nenhuma. Sujeito indeterminado que, assim, afasta a mão em falta pela
melodia a meio, entredente, tocada de perto pelos instrumentos dentados de
ausência. Os metais me tocam, alto o dia que me inebria de inexactidão. Dia
novo, armadilhado da velocidade das coisas por vir. O que começa nunca acaba,
ainda que o nome do fim seja interlúdio e os restantes, espaços esvaziados da
cor impossível. Som de passos – assim se soletra o refrão do engano. Desejo que
sejam imagens as colisões, assim se poupa a pena, liberta para outros assombros.
Assim se forma a recta inflexível, asséptica o suficiente, impregnada da soma
gástrica dos verbos, encurtados pelos pulmões prensados por um falo poluído de altura.
O que violenta um céu. Irrequieta transformação de modos, pelo esqueleto sensível
em ligas de aço rendilhado. A geometria de tudo impura – número natural – como tudo
o que desaparece por baixo das roupas – lavá-la na pedra. Sou idólatra de
tangentes, pontos negros à pele e matéria expulsa da esfera semiótica.
Badamerda aos significados poentes e às dores de corno. Assimilo o rápido de
tudo e de tudo me liberto, pelo instantâneo dos orifícios dilatados pela idade
do corpo. Anos à frente, a náusea se converte em vento amordaçado pelos
tabiques de construção antiga, transformando a exacta hora nocturna em incómodo
de tubagens. Membros operáticos por extenso aderem a notas soltas pelo soalho
espesso da desesperança em esquinas, mar-chão enegrecido pelas horas soçobradas,
ponteiros discordantes – daí resultam – da direcção de um ser localizado num
ponto de ordenadas e abcissas, ambas ocultas do interessado. As divisões de um
espaço, adulteradas pelos materiais inadequados, circuncisados acima do nível de
metro proposto a partir de um pesadelo sem cintura. Confortável ninho de pulgas
perenes, órfãs confusas pelo lugar alterado diversas vezes, em cima da hora do
enterro do mestre. Fecundas caricaturas de colagénio, embeiçadas pela fibra de
um braço em silêncio. A matilha ecoa, acidentada repetição, pela desordem
projectada acima das cabeças. Tantas as vezes que forem, não enxaguar. Permita-se
a pátina do desconforto ao corpo, armadura de cipreste, incólume ao esfaqueamento
da luz num final de tarde. As mãos onde quiserem. Ouça-se. Pássaros esquecidos
de si – a condição – caídos da sombra das folhas, entalhada nos braços aflitos em
abraços de parecença. Portas que se apagam, e outras que não existem no seu lugar,
arrancadas pelos eixos em fúrias de género. Os vãos rasgados nas fachadas,
quadrados onde o nada se inscreve translúcido, onde ninguém grita nítido.
Interiores aos muros de difícil digestão. Sejamos francos: a presença convulsa
da menina, em tosse comprida como a noite da qual se quer o luto, assim
revelada no piso inferior, não nos interessa se não for inoportuno. Apenas a
pele reage ao sobressalto de sirenes acordadas por essa noite de ambulâncias
vazias, feroz transtorno que nos perturba a cadência, em febre de pernas
afastadas pela humidade carnívora do nevoeiro, das extremidades engelhadas no princípio
do corpo, outro, assim se desaparece em simulacros de carícias desgovernadas,
pelos pulsos abertos na flor negra que respira um vento de Norte. Assim seja! E
é toda a unidade da língua des-significativa que, aqui, se evapora pelas juntas
da superfície onde me projecto infame. Das veias o fogo que alastra pela folha
metálica – cotejar –, sulcando frases inversas, libertando-se das palavras o
sedimento da conspiração crónica contra o próprio, lido como orgânica
perplexidade. O lugar de um corpo, ocupado por um só fio ligado ao crânio projectado
do nado-morto que verte a última lágrima da espécie. Onde mora a menina, nunca
aí vi roupa lavada pelas cordas. Pela sua casa se estende um latido de cão em
fome. Cedo à facilidade do círculo, desencontrando por despeito a medida ínfima
que me separa de um gesto perfeito. Traço-me.
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