sábado, 31 de janeiro de 2015

CARTILAGEM






Laminada cidade interior, altimétrica
Melancolia de gelo, curvada
Nos ombros do céu. Sua pele.
Mitológico desencontro
Do sujeito. Luz
Vertebrada.
A perseguição dissolve-se na neve
Das ruas. A aresta
Solene, quebrada. Imóvel
Sentinela do eterno
Plural.
A curva da agressão, coincidente
Nas mãos colocadas em trânsito,
Simultâneas à franja do crânio
E à boca do peito.
Um plano grande distingue
O diálogo diferente sobre
Um nome mesmo.
Quem é não o sei. Melhor
Assim, o animal de tracção se dispõe
Em angular indecisão.
Água congelada nos poros
Da pedra.
O corredor da noite, nas pontas
Dos dedos tocado. Imperativo
Na materialização da pele
Queimada pelos molares.
Esculturas efémeras, desenhadas
E abandonadas ao ar
Da sua sorte. Uma bílis
Negra de humor
Fácil.
Te desassossegámos. A gargalhada
É o teu silêncio manifestado
Por ectoplasma. Moldado
No desconforto dos planos
Diferentes.
Sancas. Lustres. Retábulos. Fustes.
Altos e baixos
Relevos.
Exausto, pronuncias o nome
Do meio. Da garganta
Se incendeia, aparente,
A sede que tenho
Do teu costume.
Braços cerâmicos me isolam
Da electricidade do mundo
Disperso.

sábado, 24 de janeiro de 2015

QUALQUER PARTE







Homem-vela a dormir, apagado,
Entre os livros inclinados para a eternidade
Da madeira. Versos serpenteiam, veios
Ao desencontro das notas assinadas
Pela culpa. Dispo a pele à pedra
Com o cinzel sossegado
Dos loucos.

Tua esquina dobrada, cinzas
Jazem no cinzeiro da terra: animais
De mim, vincados na ruga
Obscura. A boca em espiral
Se abrevia no espaço
Em fumo.

Uma sombra nunca a mais
No desenho cedilhado, meu
Passado para sempre. Agora
As margens avançadas
Por ramos. As árvores se separam
À mão pela garganta de um
Anel derretido, duradouro.

Nos meus lençóis. Se explicam
Do fundo do quarto, à porta. Aí
Mora sozinho
Um mistério.

Velo-te. Um eixo de simetria, ainda
Por desossar. Um entendimento
Do teu corpo em carne. Gémeos
Lúcidos, habituados à partilha
De toda a loucura, esta
Levada em ombros.

Praia-mar baixa-mar. Assim
Se esvai a vida, pelo orifício
Escondido da alma. Adormecido na tábua
Da paleta, um tom
Carmim.

Estás nua. Da cabeça aos pés
A sílaba multiplicada, capilar
Humidade que por mim sobe
Vinda da terra. Sabe-se
Lá. A alvorada começa, com um grito
Da luz pelas coisas
Aparentes.

Do teu silêncio meigo, a expressão
Lavrada à superfície
Do meu rosto. Pelas ombreiras
Atravessadas as divisões, no espaço
Assoalhado meu coração.

Sou planta cotada, por traços
De medo. Pelos cantos
A tua arquitectura, desavinda se desenha
Debaixo de um céu. Podia ser
Um tecto, a rematar o todo
Infinito que és. A tua luz
É véu levantado. Assim
Os significados possíveis.

Anseio por voltar à terra, àquela
Onde todas as sobreposições
De antes de mim gritaram
Às pedras e à tempestade acima
Serra abaixo, o contrabando
Dos gestos por haver.

Ateado o fogo ao céu, soprado
Pelos alvos anjos, todas as cores
São as palavras que silenciam, instáveis
Maestros do acaso.

As colinas do sonho, atravessadas
Pela pressa em ser
Lugar ao corpo. Este e aquele
Que vestimos do avesso. Braços por pernas
Do que fomos, seremos
Lábios em concha, mãos carnudas e ervas
Daninhas. As nuvens se arrancam ao tecido
Da noite.

domingo, 11 de janeiro de 2015

NISTO O VENTO





Seu ruído tique, qualquer coisa
Fácil de dizer. Repetido
Pelos outros um lado
Enodoado. Pelos arames
Assinalado. Eu e todos, alguém
Fala dos gatos.

Rasgas a intimidade ao corpo,
À mão fácil como papel
A ser separado em outras
Tantas partes do todo.

Uma fome. De vento e chão,
Rara flor, desbotada na folha
Do teu ombro. Minha boca
Se enternece à tua voz, essa
Mutação de género assim-
-assim.

Desapareço para o mundo
Em nevoeiro, cerrado
De punhos e ânsia
Igual à de outros. Tenho
Um desprezo sem temperatura
Por quem, dentro de mim,
Se deixa ultrapassar
Por dentro. Sou desvio
Onde não sou
Interdito.

Uma fome de cão
Pelos pulsos. Separados
Os tecidos ao nervo. Por gestos
Se acaba o álcool. Fico a dever
Tudo à alma. Quando for
O tempo dos acertos, haverá à mesma
A luz da tarde, assim
Se resolvem as arestas
À tona.

Apertas o peito com sangue
Dos outros. Vem a respiração
Diferente do que és, dito assim
Por outro nome.

Perco apelidos, os amarroto
Como facturas de papel
No fundo dos bolsos
De trás. Para a frente
Guardo a lua, teu sorriso
Mudo, enquanto a apontas
Para os dois, para lá de um
Breu sossegado.

A impressão do mesmo pé
Na terra misturada, acentuada
Por um grafismo etéreo.

De passagem, as vozes vão
Esmalte sem espessura, roupagem
Inquebrantável fio único, o motivo
Da teia. Pelos cantos
Ressoam as unhas no barro
Nu do corpo.

A escada que te serve
Piso acima ou chão que mexe
Contigo, é um e só
Mecanismo estridente.

Bocas de incêndio, por aí
Aspergida a tua intransigência, à força
De quereres ser maré
Ao mar, um braço
De intenção.

Afastado das rochas, suplico
Aos elementos a sua discórdia,
Para que seja perfeita
A tempestade alteradora
Dos espaços entre as pedras
Amaciadas pela lâmina
Do vidraço.

Corre. Anda. Espera – tudo isto
Em pessoas diferentes. Por elas
Um vento cai assim
De amores.

Saber da morte, à tarde e assim
Nesta zona do dia, suspensa
Pela sua definição. Sem engano
Sulcamos o corpo com mar
Nos olhos.

Chão trágico, separadas as pedras
Descontinuadas na sua pele. As mãos
Não sabem o que fazer. Se atrasam
Para o último dia conhecido.

O rosto amarga, reflectido
Em grão à superfície
Do café que esquecemos
De beber.

A caliça da memória cai
Em óxido no espelho, um sonho pescado
No rio. Vejo emergir a boca
De um cipreste.