sábado, 12 de abril de 2014

CORPO PRESENTE





Mato-a contra o vento, a voz
que se demora. No seu plural
disperso pelas margens mal desenhadas do rio.
Morosas artes por camadas – são demasiadas em
eco circunflexo, afiado.
Decido à tangente que não é sobre ela, cadáver, o que
vou calar.
Mato-a, assim que seja minha
voz. Outra que seja
interrompida no cume de
uma conversa.
Regressará murmurada, por outra
voz. Não sei ainda
se viva.
Não há lugar para ela
agora. Este é o momento
órfão de um outro, estrangulado
no incompreensível de um
barulho. Do corpo polifónico, parado
num pensamento rápido.
Sempre tardio o sol
pela espinha, o avesso
meio-dia.
Relógio elástico, de pele
pontual.
Disfuncionais órgãos, encobertos
pelo finito do corpo. Extremidades
longínquas.
Aqui-d ‘el-corpo, presente
retalhado.
Do agora, o corpo
que se arrepende.
Do agora, o corpo
que se pressente.
Outro corpo. Almas de sangue
separado por todos os tipos
de parede.
Doloroso contorno
do corpo, entredentes
do corpo, santo de azar
do corpo, instrumento incestuoso.
Demasiado corpo que sobra
à palavra – mãe.
Não sei dizer o corpo num
tamanho. Sem espaço para
o construir eterno
pelas paredes de outras coisas
sem corpo. A alma
ventríloqua . Autista
limitado na expressão
universal. Preciso desse espaço
total. Como o corpo
dispensável.
Estanque, no limite
da cortina que separa
a latrina de todos os outros
na divisão. Qualquer tecido dobrado
num pau. As coisas
mais curtas.
O pesar dos corpos que faltam
à parte melhor. Próxima
de outros corpos.
Por insuficiente memória, entenda-se
pelos cantos amarelecidos
do corpo. O som
reverberação fúnebre, o mais
branco dos espaços.
Corpo solúvel, arremessado
para a próxima sombra.
Exangue cegueira, provisória
até à morte das minhas outras extremidades.
Intermitente o olhar, nem sempre
directo. Instável
languidez das curvas
em velocidade. Instável
corpo incompleto no tempo.
Corpo matemático difícil, o erro
preciso. Negação.
Uma escolha, o que resta decidido
pelo espaço. Imparcial zero
onde tudo começou, morri.
Corpo zona franca.
Corpo franco-atirador.
Munição. Inflexível
do corpo em contraluz.
do corpo em colisão
vertical. Alguma flecha
à queima-roupa.
O reflexo de um corpo, vómito
operático. Anulado
pelo principal do rosto, enquanto
continua às cegas.
E desaparece a forma
a meio. Nem sempre
por esta desordem.
Corpo irritante, arde
tardoz. Comungando com
outro corpo de lado.
Corpo é presente, ouço-o
admirado pelos cantos.
Dele apenas a sombra
silenciosa da voz, não a sua
voz. Mato-a, e foi
a primeira.
Corpo onde mãos
falam. Não o ouço, teatro
alterne da lateral à boca. A expressão
escondida.
O corpo da frente é calmo, literatura
de superfície. Podia não ser
a palavra, uma mancha
suficiente.
O corpo incómodo, abreviado na
posição desnecessária.
O corpo de outro – principio
de chamas afastadas, as mãos
estrangeiras. Pela pele
de fronteira.
O corpo de outro, aqui, é corpo
de fora. Acena.
A voz ricochete, ritual da
sílaba terminal.
O corpo mímico, as duas mãos
ao lado. Do rosto
ligeiro espaçamento.
Abalo de terra, simulacro
do que seria.
O corpo tremor, não lhe bastasse
a órbita dos ombros.
O corpo suspeita, estrutura
inacabada.
Palavras em morse, percutidas
nas costas.
A voz em toque, de finados
esta voz. Como barulho
primal.
A voz outra, e
outra vez. Mato-a
neste presente se for
demasiado.
O corpo da mensagem encorpada
ausência.
Um motivo mal desenhado, que me descreva
melhor que a voz, juro
pela minha faca.

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