domingo, 19 de outubro de 2014

POROS







Sombra, vestígio desirmanado do que é
Princípio e lugar ao mesmo tempo
Respira por espaços. Arquitectura
Impensável, a diagonal do pó
Sobrante se acomoda, pelos ponteiros
O coração desaparece. Âncora levantada
De um fundo em erosão, o que somos,
Por momentos uma imagem no limite
Respira por nós – desenquadrada
Pelas têmporas. Delicada. Pressão qualquer coisa
Que se exerce sobre algo de um
Espelho de água, imune às pedras
Conjugadas, arremessadas
Em particípios passados.

Sombra, vestígio desirmanado do que é
Mais espesso ao corpo que somos, aí
Vem a tempestade – calandra – disposta a
Dobrar-nos pelos cantos.

Uma e mesma voz, assim desenhada
No silêncio. Acordam
As memórias, batelões despertos
Em estrondos de matéria
Férrea, acorrentada
Ao nosso peito. As sirenes pertencem
Em estorvo, ao que começa por ser
Mero grito às direcções, pela boca
Se estreita um rio em braços
Que nos pertencem até
À partícula. Grão instável, imprevisível assim
Mudo de enquadramento. Em segundos
Descafeinados sem princípio
Perturbador. Um vinho repetido
Até à carne, a sonolência de um
Gesto acentuado pelo corpo
De um outro. Poderá ser fruto
Mordido nos braços, enquanto sobra
Da mãe essa candura de sílabas
Mornas, que dançamos em pontas
De lábios. O sossego que fica
Para lá da última curva
Do ventre, raspado com violência. Aos estremeções
Todos os verbos digitais, volúpias com contorno
Desconhecido. O primeiro adeus
Mente à alma entre virilhas.
Um pé que se corrige, desfasamento
Em curva, acidente
Ortopédico o caminho do qual
Não sabemos onde nasce
A última erva. De tudo
Um passado se intromete
Pelos poros, perguntamos
Em sangue. Os olhos se deformam
Em rios rápidos, marcados
Por um instante. Interrupções
À pena, uma tinta suspensa
Das imagens que se escondem de nós
Em tardoz, imperceptíveis
Senão à linha, o momento é
Apenas diferente nas suas margens.

Árvores enormes caem
Do infinito bravio, os seus ramos declamam
Às curvas do vento despem-se devagar,
Alteram-se pelas diagonais traçadas
As agulhas. Facas empunhadas
Atingem um sol, à traição
Multiplicadas por todos aqueles
Que se atrevem à hora do meio-dia
Pela rua sem árvores, reproduzem-se
Do tamanho de cada um. Naipes
De resina igual. Os seus braços
Alteram a sombra com amor
Desajeitado. Na mesma corda
Que nos ata o coração. Na mesma cor
Ascendente e árvore, lentamente
Um só alçado. De tempo parado
Uns graus abaixo da canícula
Do mundo. Manejo pedras
Já queimadas em uma outra fogueira
Por alguém, outro pai que não o meu. Pedras
Ensinadas ao assalto, à dimensão do espaço aberto
Pelo lacre que escorre em chamas, de uma
Carta aberta. Suas palavras pétreas
Escondem o tempo, o que foi
Periférico a nós em estórias. Uma parte esquecida
Pelos sonhos, cedo vão
Em espécie alguma de acontecer, assim
Incompreendidas entre o que sobra
Da noite e a monotonia
Da tarde. Por ela, certo peixe
Que persegue os outros. Por medo. A medo
Segundo certas testemunhas oculares. Eles ficam
Ao pé da sua boca, eu finjo
Que fui e não
Volto e não quero
Saber do dia seguinte. Repito-me
Pelos outros, eles
Se separam, se despedem
Por mim. Paro
Sempre numa paragem antes, saio
Do destino – para aí
Escrever. Dobro a tinta,
Recolho a linha mais tarde
Volto à vida, serei outros
E outras coisas. Não
Demoro se o faço e se acontece assim
É por chegar cansado. Atrasado
De um outro lugar, de uma hora
De respirar demasiado
Rápido. Expelir à maneira de suor
Esta folha e precisar de outra
Limpa, isenta sem o ser uma
Margem seca afastada da água
Do meu humor. Moedas de mil caras
Translúcidas se fazem
Dançar, um apelo
Em estrofes. Caras e coroas
Em que tocam as mãos
Esmaltadas.

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