sábado, 4 de junho de 2016

PELAS ESQUINAS SAGRADAS, O SANTO OFÍCIO DAS PUTAS









Começo por dizer mão esticando-a
Buscando fio azul,
Marcando no chão em tosco
Da memória engrossada
Metro em metro, as idades
Tempo para tanto,
Este desvio
Comportamental.

Casamento de conveniência,
Sonos trocados se quebram
Na aresta mais acidental
De um rosto marmóreo,
Falsa linha separando
A abrupta liberdade,
Do fosso onde se lança
Asa à aventura
Dos sons conhecidos, teu nome
Contra a nudez
Da pedra.

Iluminado rosto emendado,
Troca-tintas,
Com a mentira
Incendiária.

Se confunde vontade com dever
Ser, em um corpo absolutamente
Narcotizado. Completamente doido,
Chicoteado nas têmporas,
Quanta música; quero
Que sejas tu a pôr
A rodar o disco
Da Fortuna, no prato cheio
Da Fuligem depositada, pura,
No terreiro afectação
Pela voragem de um vento
A tempo, se levantando a poalha
De um branco a branca, géneros
De pele aberta, atacada
Por bicho-da-seda, alfaiate
Do pensar, em mar
Vago, recuado
Até caber num
Meio copo.
Se bebe o primeiro
Para esquecer
Se bebe o segundo
Para não lembrar mais.

Não o conheço
Só corpo querendo
Tudo atirar na cara, ao negro
Da noite arrancar por baixo,
Única demão
De esmalte à mesma
Cor,
Um a um, cada
Inerte a desnivelar
Caminho pela sombra
Perigosa, exaltada, exalada
Por tua boca, única
Nuvem de ópio.

Mãos de carvão desenham
O círculo ateado ao gesto
Nada significativo.

Apanhando o sinal de sentido
Obrigatório girá-lo
Desgovernadamente na direcção
Que já sabemos.

É como diz o outro, tenho
Amigas putas, por vezes
Bolsos cheios de dinheiro
Por queimar
No interior do peito
Enquanto arde,
Lhes virando as costas.

Todo consumo responsável
Por fazer de mim:
Aquilo que se não vê,
Alçado do que fui
Tardoz que serei,
Alguma carne já separada
Da idade que teria por certo,
Para o talho da Ordem
De tudo ditada.

Timidamente sorri sempre
Não sabendo onde largar
O maxilar, tremendo
Na oportunidade
De outra boca.

Acerto vagamente nos contornos
De quem comigo esteve
Num desses dias.

Que maldade pede por favor
Depressa! Estaremos a olhar
Fixamente um outro
Corpo para ocupar
Com a negligência
De quem não quer
A coisa do AMANHÃ.

Sim, é bonito conseguir
Uma grama de favor,
Comprada em mãos,
Com os dólares do patrão
(num pulo ir
às casas de câmbio, ao Rossio)
Da pequena secretária
Que tanto gostava
De ser enganada, e mesmo assim
Querer subir ao último piso
Do edifício onde trabalhava,
Fumar crack pelo cachimbo,
Descer à pressa as cuecas,
Não sabendo o que primeiro deitar fora,
Se fumo ou gemido,
Enquanto levava com ele
Por trás, volto atrás
Onde dizia «Comprada
Em mãos» ao
Dealer à paisana. «O Careca
É aqui!» largado
O pregão a partir
Das ombreiras da porta
Onde começa a rua
Onde nos perdemos, perdemos pois
Assim o jogo da compreensão
De tudo o amor
Aos outros que se perdem
De nós. Voz grave,
«UGA!» multiplicada
Lançada contra as paredes,
Lá se vai ele,
O dealer e um quarto
De grama castanha,
Fechando-se por dentro, por fora
Uma velha casa
No Casal Ventoso
Que não existe já.

Um minuto de vida, a morrer
Escorrer para fora
Ressaca que tudo compreende,
Não percebendo ainda que, aquele,
Tal um grande amor,
Hoje não volta mais.

Pior. Ir à pressa, febril
Atravessar o rio
De cacilheiro ou autocarro,
Roubar o que tiver
De ser, voltar a ter
Mais cuidado
E apanhar
Na outra mão o saco
Plástico, minúsculo
Nó a correr
Desatado, o interior
Já se vê daqui, é
Frágil ruína.

Se dança em todo o lado,
E ninguém
Se olha nos olhos. Sim,
Sou louco. Por querer te
Ver ao perto
Sem farpela, nua
Tonalidade de pele, querendo lá
Saber o que pensas ou
O que vais dizer
A seguir.

Não batas à porta, nunca
Cá estarei. Mais tarde, sim,
Vos confesso, um destes dias
Segurar-lhe-ei na mão.

Polegar e indicador apertam
Com a força de um
Universo, essa força instável
Pó ao pó despejando
A vazadouro, à superfície
Do tanque autoclismo ou tampa
Da sanita, a partir de
Aí alinhar ao centro
As avenidas da ânsia,
Engordando aos olhos
Tamanhos.

Acertar arestas à nota,
Enrolar os rostos
Frente-e-verso impressos
Em sujo papiro
Destes tempos, com precisão
Geométrica.
Levá-los a ver rua,
Ordenando-os à demolição
De todo o edificado traçado
De impurezas.
Vir para dentro, fechar
Qualquer abertura de vão
Esquecido
A comunicar para fora,
Ficar num ponto determinado
Do corredor escuro
À alma, restando esperar
Senão o estrondo do Universo
A se estatelar sem barulho
Associado.

Descemos a Santos,
Vamos com pressa, não
Havendo lugar
Exacto onde
Chegar, a esperar
Vê-la àquela ou outra
Qualquer em azul
Escarlate ou escarlatina,
SIDA ou outra
Morte avulsa,
Vamos a jogo à Roleta-
Russa, atravessamos
De mãos dadas
A Fronteira somente
Imaginada do tudo possível,
Aí nada nos atinge de mal,
No buraco onde tudo cabe
Supositório dedo ou bala,
Me perguntas o nome,
Esqueço de to dizer,
Subimos ao quarto,
Rendes mais do que custas,
Tão ou mais alterada
Que eu?
Enfias a língua
Onde caiba em mim,
Respondo na mesma moeda,
Levando à boca
Restos de outros
A escorrer por ti abaixo,
Te nascendo
Como filhos sem pai,
De si mesmos. Lava
Insana mistura incerta
De droga e sémen,
Rio a penetrar o mar
Em frémito usual.

Delito narcótico, apontado
Golpe baixo
À goela.

Mutação de género,
Sensibilidade arraçada
De todos os sexos
Existindo, a sair-me
Do orifício ilógico
Duplicado pelas bandas
Dos mamilos entesados
Por todos os ventos.

Verbos na forma tentada,
Fornicação sob o Céu
Infinitamente
Erógeno.

Largar bilhetes encardidos
No colo de alguém
Meu vizinho no assento
Interior do transporte público,
Enquanto escorre fio,
Não parou ainda,
Da loucura ácida
Pelas narinas, não se escondendo
O quanto se é
Doente por outros
Corpos. Folha arrancada
De lugar qualquer,
Escrita à pressa
A dizer número
A marcar este é meu
Contacto minha ânsia
Transformada na voz, digo-te
Por poucas palavras,
Por extenso a elegia
Que sempre ousaste querer
Estremecer a ouvir
Voz onde
Se lê «QUERO TE
FODER».

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