domingo, 9 de abril de 2017

NÚMERO NATURAL







Conta. Conta até ao número que souberes, o teu número. E se nada se souber do que aí vem, mil e qual coisa tal resultado, ninguém te levará a mal. É da tua conta, são as tuas matemáticas. Subtrai-te ao mais que houver, coloca o menos ao lado do que escolheste, para ser igual à hora em que arrancas raiz às coisas, multiplicando livremente a desordem por todas elas. Escolhe a equação que puderes, mais à mão. Não te esqueças porém que, agora que nos dividimos em dois, fomos um dia um só.

Divide também a manhã pelo dia, e nunca será tarde. Teoremas, teodolitos, temperaturas – tudo cá fica, mesmo se te pões à distância, tomando medidas urgentes. Direcções ordenadas por setas brancas, a estória que souberes pôr a contar numa folha lisa. Cabeças de alfinete, tu e eu, vistas de cima pela última vez. Os corpos, luzes sobrantes ao que foi a noite.

Aos motores, a mecânica ágil dos condutores de estações. Hoje é dia até mais tarde.
Aos motores.

O olhar derramado pelo ébrio, líquida lâmina desconfiada, cortando a direito sobre tudo.
Com licença. Passou bem? Lá, agora. E nada de espaços em branco, por entre a metamorfose do parágrafo automático que me ditas. Perguntaste, respondo. Com este esgar, transmitido para o longe de um lugar chegado, é o que manda a boa prática. Meia hora depois da última linha, se continua a nada sentir. Meus sentimentos, ó cadáver pontual.

Peixes de fora, nada, aparafusados ao muro de suporte separando águas a ruas diferentes, uma que desce outra que desaparece. Pássaros sensíveis a correntes de ar. Santinho. Linguagem igual, acentuada com a distância ao lugar onde nunca fui. Aponto a trepidação natural dos volumes. Esvaziando o verbo. Criança hoje e sempre na mesma, correndo por aqui fora, convencendo à pressa pássaros que são do céu mesmo.

Curvas e contracurvas em traço de encher vazio, aguardando tinta que o fixe. Ao momento. Vinganças que não vêm a propósito. Tanto faz fazer-lhe o mesmo. Estás a olhar para onde?
O sinaleiro, engarrafado em paredes de vidro; trânsito dele só, tiques e traques, na via de fora, ascendente em esquece lá isso.

Diz adeus.
Isso. Diz.
Assim está bem.
Estás bem? Estou? Está
Lá? Sim,
Sou eu. Não
Adianta mentir-te.
Vais sair? Pergunta
A criança
A um
DESCONHECIDO.

Folha de rosto.

Daqui para a frente, nada. Talvez soubesse já, aqui chegado, mais não era o que sobra a um sentido de posse sobre coisa sem matéria – saber que havia aqui passado, sombras no lugar delas, conversas interrompidas na mesma sílaba. A conjugar verbo repetir, de trás para a frente, de encontro a uma parede. A ligação entre materiais diferentes, deixada ao acaso, ficando por rematar a essencial diferença entre nomes. Códigos diferentes, comandam a abertura e fecho à mesma porta. Espíritos aligeirados por conta de matemáticas inquietas. Caem todos em decadência exagerada. Não vás mais longe.

A meio corpo – metade penumbra, metade nuvem – se atinge a perfeição do afogamento, se bastando a depositar físico de pernas para o ar, na concordante à lâmina líquida. Nem sequer sete palmos são precisos, e às vezes um só centímetro faz diferença toda.

Se ocupam de ausências, com um espelho na mão, apurando extrair o melhor de um mau perder. Lá vem este agora, com seus loucos e desnecessária refeição de modernidade. Lá do fundo, dir-me-ão extravagância ou regular mal-entendido que mal percebo, vindo a lume soprado pela mão aberta em leque, chama directa, ida certeira ao coração dos sentidos. Dor será, se não for quase sempre outra coisa de aqui continuar andar.

A sola é complementar do intelecto: andas para aqui, em pezinhos de lã, vendo longe os navios que há muito se foram. Guardas no cinzeiro fósforos ardidos – é a madeira desses navios idos já, lá para o fundo. Juntas que não casam, espaços vazios por preencher. A espuma do sonho se expande, até onde vai ou racha a estrutura social das habitações no corpo. Salas de estar por estar. Hábitos que se adquirem, portas que se fecham por si só.

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