Em
risco. Amarelo, castanho, branco. Por cima ao que vai de perna, coxa. Usa ela
véu e signos de mar e vento. Cai de um sono profundo. Lhe ofereço traços de
horizonte, terra batida, barba e cabelo. Por um nada os olhos fechados,
pestanas atracadas ao rosto. Abrimos o coração, fechamos a porta para os outros
de nós. O sol não se vê já; teus seios sim e minha mão livre, torcida pelo
desejo de os querer como segunda pele à primeira tentativa. Duas páginas em
negro, uma em branco e a que vem mal escrita. Um tempo, uma data, um ano, um
antro, uma cidade, um evento, uma demão de gente, uma evidência. O nome que
lhes foi dado. Produtos do ócio, mercadorias conseguidas a troco dos elementos
naturais. Não me falem em fogos, para já. Digo sim, a palavras novas, digo sim,
a beijos mortais. A coisa que fique por algum tempo. O nome principal de uma
organização secreta. Mancha escrita, texto pintado. Olhar ali. A linha curva de
um crânio diluído no fundo cinza desce a pique se enruga acima dos olhos, vai
de ângulo continuando a queda para a boca. Lábios juntos, voz aprisionada. Do pescoço
para baixo, roupas apertadas, adivinhas. Mão fechada ao cabo do espelho virado
para ti. Rosto e sol, hábeis instrumentos de encadeamento. Nudez e distância. O
mistério rabiscado nas tuas costas. Superfície omnifóbica, o quotidiano. Nada fica.
A distracção, punida pelo ponteiro afiado dos mestres transformadores de
elementos pétreos. Mãos entrelaçadas, pesadelos contornados pelo lado do
avesso. A ânsia pelo conteúdo, o abismo da peça maciça. Inquebrantável. Veios de
madeira a fingir. Música deixada a tocar no último quarto, chegando pelo corredor,
saindo pela janela, voltando a encontrar a mesma árvore. Toca e foge. A fúria
por nada mais ter por dizer, estampando o veículo do coração de encontro à
parede óssea deste edifício aldrabado que tenho por habitação corrente. Simbólico.
O programa da vida, impresso nos mosaicos: reflexos e distorções, nenhuma
verdade. Enfatizar a superfície, mostrar o contrário. Abandonar a história. Orientar
o caminho a olho, rasgar o projecto insuficiente. Me ponho a jeito ao corte do
golpe das tuas mãos, mãos listadas de noite dia. Olhar ligado pelos tecidos do
corpo. Alma vendada pela espessura do esquecimento. Esperar ligar um ponto ao outro,
por traço de contacto. Ter sede, não ligar. Com rede de malha apertada, vedar o
acesso ao lugar da obra. Aterrar a cratera da dúvida, com materiais de
empréstimo. Engolir o mar, vomitar o abismo. Noite e água de rosas. Um dragão
por dedo, ateando espasmo à linha do teu desencontro. Assinar de lado a
tragédia que evitamos, voltando as costas um para outro. A vocação levada ao
extremo; tocar em tudo, não sair na próxima paragem, não limpar os óculos. Vestir
preto e rosa em dias diferentes, gostar dos dois e de nada. Levar o contorno
dos nossos perfis a ser nunca mais que um princípio de nevoeiro, soprado de
cima por anjos incaracterísticos. Pendurados pelos cantos, os espinhos desta
flor nauseabunda que nos enterra vivos com o perfume de corações decompostos. O
articulado romântico, martelado nas colunas do artigo retalhado à unidade. O amor
às formas, mandado àquela parte. A alma, flor que não vinga, uma ordem de
números ao fundo na folha, em letra pequena. Não é nada, dizes. Um olho-de-boi
por onde se vê, do outro lado da porta de segurança, um paraíso de sentido
único. E uma mãe cansada, montada por anjo de segunda. Anjo selvagem mascando o
tabaco do céu, cuspindo curto e grosso esta pasta do hábito no corpo da outra
senhora. Toda visão, guardada de cada lado por um colosso aborrecido, acentuado
no tom narcótico; tão distantes ou mais, como aquilo que guardam para si. E ninguém
os vem render, até ver. O motivo, é só metade da razão. Ganha-se em tudo, não
se perdendo pitada. Fraca evidência. Semente amarga. Serpentes, serpentinas
fulminantes. A festa do teu rosto sério, impassível, enquanto dizes entre
tantas vezes. A caveira se parte em suspiros, améns e loas. Cordas afinadas por
executante cabisbaixo. Estátuas de musgo, uma posta a cada lado seu, choram a
seus pés larvas intermitentes. Servem-se licores e venenos, entornas o corpo no
chão flutuante. Espalhas um livro por cada divisão ao lugar, te demoras diferente
em cada fim a dar a cada um que pede outra coisa. Tiras vermelhas, rubor
esfiapado, cobrindo tuas vergonhas, mal dando em me impedir de te cobrir
uniformemente com o óleo da minha mania. Louvada sejas, por me pores pior. Corto
a sebe da intransigência com faca romba – belos desenhos, de monstros
encostados ao fundo no jardim do horizonte. Alma de pavão, corpo infinito. Nus,
de joelhos; encostamos as mãos de ambos, à armadura fria de um Deus corpulento
olhando sem expressão, para depois de nós, na direcção dos destroços que
plantámos nesta noite fértil. Ponto, ponto, ponto. Pontos desenham o deserto de
vidro que se estende, estável, a nossos pés encardidos. E ninguém dorme,
enquanto água não for encontrada, dê por onde der seja qual for o estorvo para
quem. Sol negro. Triângulo castanho, inserido em triângulo branco. Línguas-de-gato,
espalhadas ao fundo das escadas para o sótão. Símios. Jogos de azar. Constelações
em aço temperado, temperaturas desmedidas. Resistência ao corte, frágil à
compressão. Não mexer, enquanto se não resolver outra coisa e outro destino. Corresponder
a cada parede, uma fixação. Mentir sempre, em lugar do morto. Trazer à vida, as
figuras femininas cinzeladas no friso da imaginação. Perder a altimetria, esta noção
de altura certa. Jogar tudo aos bichos. Lamber-te os dedos, empurrá-los para a
tomada de corrente; fazer do sémen bom condutor. Estragar tudo com palavras de
amor. Escolher sempre fruta da época, esquecer o que foi dito ainda ontem. Melhorar
os insultos proferidos, com os dentes a ranger, durante todo santo dia. Fingir que
não se liga a nada. Exagerar na água a verter, por sobre as plantas já mortas. Falar
para elas.
Sem comentários:
Enviar um comentário