As
carnes que forem mais salgadas devem ficar de molho
Saí da prisão há pouco.
Alguns dias.
Os primeiros em liberdades de retoma.
O mar.
Dizer para os outros, chegados, aquilo
que quero sentir dentro de mim.
Lição.
Apreendida.
À boca cheia de mil razões.
Que sim.
Agora é todo um caminhar. Falta é
aprender.
Os pés às vezes sofrem de falta de
direcção.
Em pequeno usei botas correctivas.
Pesadas. Como me sinto.
Convém ser passos pequenos.
Não aquele tropeço, esqueço.
Vejo-me de repente, e de forma
naturalmente forçada, com a necessidade de preencher os dias.
E a economia. Nisso, mãos largas.
Arranjo, com bengala em cunha, um
biscate.
Gosto da palavra, respira-se. Com um
sentido de não definitivo.
Se um gajo trabalha, respeito!
Se é um biscate, desenrasca-se.
Todos os dias deveriam ter uma
componente, ainda que em part-time, de biscates. Sempre são uns hobbies.
Este, no armazém das oficinas onde o
meu pai trabalha.
Ainda bem que um pouco ao lado.
Porque não temos ambos muita paciência
para qualidades de tempo em família.
Em que dignos condutores de monólogos
da coisa certa.
Tem de ser sempre daquela maneira,
senão parece que não resulta. Teimosos.
Convenhamos.
Melhor outro tutor a quem prestar
vassalagem e serviço. Menos chato.
Parece que sem sentido de humor.
Tem noites.
Que a gargalhada mergulhada em cascos
de carvalho, chega a convencer-me da sua certidão.
Na minha de nascimento, ele meu pai.
Na oficina da arte, a que me dedico por
estes dias.
Estes começam sempre pelo balneário.
Antes de entrar em campo.
Fracção urbana, com sabor a betuminoso.
No escaldante parque de bobines de fio
eléctrico, a que recorro cada meia hora na parte da manhã, para acudir algum
electricista com pressa de ir almoçar ao Prior Velho.
Hoje é dia de cozido à portuguesa.
Volto para a troca.
De calçado e de meia.
Até na farda tem de estar tudo a
condizer, que os espelhos dos vidros dos carros insistem em devolver-nos a imagem,
de formas nunca à escala real.
Mentem-nos.
Porque nunca é reflectido o bom de ti.
Ou porque assim não acreditas.
Antes despenteado, que o gel deixa
vestígios.
De partículas confusas em assumir o
papel de transgressor, da cabeça em alma.
As botas com biqueira de aço permitem o
saudável exercício do desdém.
Pelas coisas em que tocas.
Rei Midas da ferrugem, das porcas e
parafusos.
Desbobina.
O senhor das tensões, altas e normais,
está à espera.
Que depois arrefece a refeição.
Pelo meio, conversas de bola e remates.
Alguns certeiros, eu é que não gosto.
Partilho outros.
Já não é mau.
Doutra forma, ausência. De fora para
dentro. Nem que seja o ambulatório do Miguel Bombarda.
Uma pessoa tem de nutrir algum especial
nem que seja gosto, por algo.
Às vezes.
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