- Desconfio de lugares mágicos.
Encerram em si a disponibilidade de te
tornar ilusionista da rotina.
Mas este não.
De naipe cheio e convulsões do seu empedrado
irregular, que se torna num morse cacofónico de teclas pretas e brancas.
Lisboa. Maior de idade.
Que sinto na minha pele como mais um
pêlo encravado.
Incrustado.
Relação de quase adopção por esta
mãe-cidade, que tanto afaga com os seus reflexos dourados em esquinas de
transitário, como repreende em cada escadaria do desequilíbrio.
Com ferro a meio. Tauromáquico.
Sente-se a continuação do braço de
metal chumbado na calçada, a prolongar-se pela estratificação do terreno das
memórias.
A repetição de cada sonho, ou a
percepção deste, em cada beco visitado.
Alguns com mais frequência, mas sempre
em descoberta.
Arranjo sempre algum exemplo da vivência
nesta cidade, como grafitado de fantasia.
Nas paredes de reboco instável das
areias de ampulheta, que não esperam pela ordenação do teu pensar.
Mal arquivado.
Gosto de me perder no encontro com a estória.
Das almas várias e divorciadas da moral
vigente.
São puras.
O pulsar das suas tascas, com as rugas
da vida bem presentes nas caras dos velhos cujo olhar é o bastante para que
entres nas suas muralhas do conto.
Mesas de canto, prefiro.
Em que traço as diagonais bastantes, no
encontro do meu observar com os daquelas personagens reais.
Não pedem permissão para te contar as
suas dores do parto.
Difícil dos dias.
Apenas uma esmola.
A do copo de vinho partilhado em
poesias de jarros cerâmicos.
Vermelhos do lastro.
Acudo ao miradouro das Portas do Sol.
Que a cidade também precisa do afago
dos seus poetas, sempre perdidos nas suas palavras.
Em ordenhas da composição.
E por vezes descuram o gesto.
Do conforto em dizer-lhe que a
habitamos, muitas das vezes no egoísmo de confessionário.
Ela, parece que obrigada em ouvir-nos
em surdina.
Porque lhe pedimos tanto?
É só a procura da solução para o
caminhar de viajantes do verbo.
É pedir tudo.
Estaremos nós em condições de a receber
nos braços no final dos tempos?
Em velhices do dedilhar.
Guitarras a chorar, órfãs dos mestres.
Lares da conveniência.
Temo que acabará por ser abandonada à
mercê dos umbigos.
Salteadores da riqueza que pensam ser
as suas entranhas.
Pura ilusão das almas menores, violadas
em criança, ao lhes ser roubado o choro da emoção.
Insanos.
Não vêem que os tesouros do ofuscado
foram já imortalizados.
E transformados. De ouro dos reinos em
palavras.
Em poesia.
Troca justa e com sentido do seguro
contratado.
Lisboa nunca foi enganada.
Iludida, por vezes.
Em paixões de dor pelos seus amantes de
passagem.
Porque quis.
Nunca abriu as suas ruelas com desdém.
Antes entrega.
E sem ciúme quando observa o carnal a
acontecer, em prédios de Alfama a ruir.
Do peso dos homens e mulheres, menores
nas suas pornografias de substituição.
Encantadoras na sedução dos xailes em
garrote nos pescoços desnudos.
Sou obrigado a admitir que ainda não
estamos prontos para a oferenda sem retorno.
Cantiga do bandido.
Ela diz que espera.
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