Ter
por costume andar
Vagarosamente
a pé, junto a paredes
Sinalizadas
com o aviso
De
derrocada eminente. Caminhos
De
fuga, onde
A
escolha é única. Demorar no que tiver
De
ser. Entretanto
Virar
na esquina anterior,
Descontinuado
de outros ombros
A
falar sozinho, animado
Por
todas estas arestas
Que
nos separam. Representar
O
pensamento à letra
Para
não me esquecer
Do
que sou e
Doer
mais do que é necessário,
Para
estar presente
No
meio de tudo, tangentes
Traçadas
de modo cego àquelas
Paredes
enquanto elementos
Verticais.
Droga
de substituição. Deixar
As
palavras sólidas, impregnadas de
Princípios
activos. Deixar
Derreter
por debaixo da língua.
Quando
acordo a tempo, pela anestesia
De
sentidos e expressões
Possíveis,
nada
Disto
quero dizer mais
Do
que seja ocupar o habitáculo
Da
alma entre uma hora
E
outra.
Ninharias
de combustão espontânea
Enquanto
houver terra
Para
arder. Treino
O
olhar de tanto ver, quase cega
Sem
saber bem por onde vão
Todos
estes movimentos, bruscamente
Interrompidos
onde se iniciam
Outros
de mexer. Pôr a mão
À
pena, descer-te pela cervical
Quase
sem perceberes
Que
sou eu e é minha
A
voz que te ocorre demasiado
Perto.
Dizer gritando
Simultâneo
ao olhar, quando não
É
outra coisa que me ocupa.
Por
simpatia me aproximo
De
ti. Ao que és parte
De
curiosidade e feitiço, as rugas
E
esgares fora de esquadria.
Atraído
por temperaturas
Inexplicáveis,
não
Sinto
quase nada
De
especial. Por um
Qualquer.
A verdade é
Que
sinto. Pouco
O
que quer
Que
seja.
Invertebrado
de sentimentos, choro
Pelas
coisas erradas. Habito
Um
inverno de verbos, cinzentos
A
maior parte. Fósforos
Uns
atrás dos outros, um inferno
E
que bela é a luz que nego
Por
detrás das cortinas, separada
Por
tons todas as saliências
Ósseas,
da sua natureza
As
árvores em excesso
De
carga, motivadas
Por
pássaros calados e maravilhosos
Nas
suas penas.
Picada
até ao osso a construção
Dos
dias, paredes divisórias
Que
se deitam abaixo
De
quando em vez. Por momentos
Vemo-nos
uns aos outros
Nas
posições distraídas que são
Só
nossas.
Aflitos,
abrimos a boca
Pela
calada. Olhamos
Um
para o outro. Dispomo-nos, compostos
E
indispomo-nos. De qualquer forma
Vai
tudo abaixo, com o peso
Que
se transmite às coisas que ficam
Para
depois. Até ao osso
Nos
livramos de uma coisa
Pior,
deixamos o esqueleto
Porque
faz falta
E
rasgamos a fachada
Para
que deixe entrar
Toda
a luz que se lamenta
Nas
ruas da frente. É frio
O
cimento no chão
Sem
mais nada. Rugoso
Aos
pés e à voz que fica. Convergimos
Em
um ponto, nós
Perdemos
tempo a dividir
O
espaço num sentido
Que
se entenda. Quando necessário
Nos
encostamos
Topo
a topo, regados
Por
um mínimo de compreensão. Frases
De
merda, cada matéria
Aprende-se
a olhar
Cada
coisa que vive e não
Arrancada
ao seu hábito, a mão
Que
não hesita.
Humidade
transmitida pelos corpos
Às
paredes que se evaporam
Em
menos de nada,
De
cima para baixo. Riscam-se comodidades
Directamente
no chão
Com
o azul que se despenha
Do
céu, pó de anjos
Construtores.
Mandam
As
boas práticas, que se deixem
Alguns
espaços à pele
Para
que se revista de espessura, uma
Esperança,
a resistência
Aos
elementos. A partir daqui
É
uma questão de tempo,
Chave-na-mão
para o que der
Quando
vier. De mim,
O
que vou contar não acontece
Destas
paredes para dentro,
É
fora de mão em frente
Ao
prédio que queiram que exista, e não existe
Campainha
para chamar
Quem
por ali estiver
Para
estar.
O
varredor incomoda,
Com
o ferro da pá e as cerdas da vassoura,
O
separador central de betão
Encardido.
Se movimenta
Mecânico,
o rosto prolonga-o
Com
o vazio dos olhos, que prende
Frontal
a cada carroçaria
Que
por ele passa.
Varre
quase tudo para fora
Do
utensílio, parece se interessar
Mais
por cada rosto
Ao
volante, de certa forma
Tentando
provocar a distracção
De
quem conduz a máquina
Por
este livro aberto
De
asfalto.
De
ruídos intestinais, repetem-se
Os
fantasmas colossais. Rangem
As
condutas no seu trajecto
De
ar acima das cabeças, o espaço
No
chão irregular de vinílico
Sobressalto,
que se estende pelos dias
Em
rasgos assimétricos. Estruturas
De
suporte revestidas
Por
inox escovado, pela tosse
Dos
transeuntes. Sonoro
Aviso.
Porta
de um prédio. Em alumínio
Anodizado
de dourado. No mesmo material
Almofadas
inferiores, duas folhas
De
vão. Um fixo, outro
Móvel.
Dois puxadores à altura
Que
devem estar, por volta
Da
cintura da maioria de nós
Mal
medidos em cor
Preta.
Em um dos vidros, um
Rectângulo
de papel colado
Nas
bermas com fita
Mais
ou menos
Transparente.
A mensagem
Gravada:
PUBLICIDADE
AQUI
NÃO,
OBRIGADA.
Alguém
Que
se aproxima perigosamente
Da
entrada. Pára.
Se
senta num dos muretes, lateralmente
Disponíveis.
Em pedra
É
mulher, tem um ar
Vencido,
fuma como
Se
o tempo tivesse metade
Da
duração dos relógios, esses
Medidores
da temperatura
Dos
dias. Usa cabelo
Mal
cortado, cor incerta
Próxima
da paleta
Dos
castanhos, será
Porventura
a sua cor
Verdadeira.
Não parece ali
Morar.
Espera apenas
Que
o cigarro se apague
Nas
unhas, alguém
Que
a venha buscar ou
Se
esqueça ela mesma
Que
ali se encontra.
Pelas
costas uma sombra
Rapidamente
se torna
Nítida.
E transborda
Pelos
cinco degraus
De
uma mão. Leva a chave correcta
À
fechadura da porta
E
entra. Assim
Se
permite a passagem
Para
o interior
Da
construção. Da rua
É
visível o átrio
Das
escadas, uma bateria
De
caixas de correio
Na
parede direita, um
Ressalto
no pano implantado,
Raias
de mármore confundem
Os
olhos na altura
Do
pé-direito, a tela
De
arte avulsa, a animosidade
Do
que é naturalmente
Arrancado
ao coração
Da
pedra.
O
cigarro se extinguiu,
A
mulher por ali ainda
Permanece,
se finge
Ocupada,
desinteressadamente
Exposta
em reflexos
No
espelho. Surge do nada,
Assim
como tudo,
Uma
outra personagem, uma outra
Mulher
de sorriso fixo, toda ela branca
De
costumes, rápida
A
estender a mão com uma
Publicidade
a um centro
De
recuperação física. Pergunta
Uma
mulher à outra «Posso
Entregar-lhe?»
A voz
Ainda
fica, enleada
Por
momentos no ponto
De
interrogação – enquanto voz,
Da
sua dona se prolonga
Pelo
passeio, desaparecendo
Por
detrás de uma esquina
Próxima.
A mulher que fumava
E
se desinteressava, outrora
Lenta,
também
Desapareceu.
De memória
As
suas vestes, preto integral
E
calçado de caminhada
Na
mesma direcção
De
tons. O velho
Porteiro
conhecido
Dos
dias e do hábito, saca um
«Boas-tardes»
E
sobe ao patim
Do
prédio, se volta, lê
Algumas
matrículas, rápidas que são
A
escrever-se nas folhas
De
asfalto. A estrada em frente.
Coloca
a chave na fechadura
Com
a precisão silenciosa
Do
hábito, desaparece para lá
Da
porta em esquadria
Com
o ressalto revestido
De
abstracção. No interior, em frente
À
porta da rua, se implanta outra
Porta.
A do elevador.
Por
momentos não
Se
regista qualquer movimento,
Depois,
quase
Em
simultâneo, chega
O
carteiro. Pelo reflexo
No
vidro da porta
Do
prédio, e não sendo
Motivo
de distracção
O
pequeno rectângulo
De
papel com a mensagem
Que
lá está, é possível
Se
perceber o trânsito
A
engrossar. Chega
Outra
pessoa mete a chave
À
porta. Entra e
Desaparece
– Por qual das portas?
Entra
a tarde pelo céu, se abre
Uma
ferida móvel, o rasto
De
sol ateado por um
Avião,
enquanto o próprio
Sol
se evade por detrás
Da
mancha antropófaga
Da
cidade, reduzida
Ao
seu pouco de cada vez
Que
se olha assim
Desaparece
aos olhos.
O
trânsito não coagula,
Ferida
aberta ao ar
Escorre,
exposta em pus
Metálico,
se exala o corpo
Urbano,
um perfume
De
borracha usada, percutida
Pelas
engrenagens. Sacos
De
diversos tamanhos ocupam
As
mãos das pessoas
Desta
hora. Duas freiras
Impecavelmente
vestidas, e os seus
Óculos
de aros redondos
Assentam
nos seus rostos
Engomados
– passam outros
E
comem a andar,
Mãos
nos bolsos. Comem
O
que houver em um
Distribuidor
de rações
Automático.
Sobrepostos
em camadas
Autocarro,
comboio e
Viaturas
escorrem, expostas
Em
pus metálico.
O
dia, outro. Seguinte, assim
Clareou.
De manhã
Sol,
agradável
Até
aos joelhos. Pelo meio-dia
A
luz se aborrece
Em
fiapos se mistura
Qual
café com leite,
Derramando
o apagamento
Gradual
pelo céu
Servido.
O porteiro
É
digital. Se acerta
Com
o comboio que vem
Do
outro lado, e aqui
Chega
preciso
Às
13h18. Dêem-lhe
Dois
minutos, e é
Vê-lo
à porta do prédio. Não
Do
lado de fora, na rua,
Mas
entalado na porta
Entreaberta.
Usa óculos
De
fundo de garrafa,
Porém
acreditem. Tudo se vê
E
nada, a ele
Escapa.
Mora nos fundos
Se
não mesmo abaixo
Da
terra, sua expressão
De
toupeira alinhada com as suas
Mãos
à altura do peito. Observa
Apenas
o movimento, frontal
Como
alguém que se isola
De
nervo ao receber
Um
vento agradável,
Numa
dada altura de um
Dia?
Não, espera
Pela
sua mulher
Que
se não teria
Demorado
por aí
Além,
e vinha
Com
o saco do pão
A
sacudir em um
Dos
seus braços. Um casal
De
porteiros. Matemáticos
Da
disponibilidade a todo custo,
Se
revezam como
Numa
corrida de estafetas. Que o corpo
De
um deles tem de estar presente
Dentro
de portas. Murmura
Algo
o porteiro, a mulher
Compreende.
Sai ele
E
não demorará. Será breve,
Semibreve,
o tempo
De
calcorrear os dois passos
Mal
medidos entre a porta
Do
prédio e o interface
De
transportes públicos
Ao
virar da esquina. Quem sai
Do
prédio virado
Para
a rua à direita. O carteiro
Chega.
Semibreve, o tempo
De
se ouvir o eco vago
Do
papel recortado nos sobrescritos
Que beijam à força
O
fundo frio do metal
Da
caixa do correio. Toca ao mesmo
Tempo
as campainhas,
Mestria
de pianista que conhece
Os
nomes de quem
Ali
mora - «Correiiiooo…
…Obrigado!»
Uma
velha traça
Meia
a circunferência
Da
sua corcunda,
Pela
faixa de rodagem. Um puto
Vestido
com casaco
De
capuz, abstrai-se
Suspenso
pelas batidas
Da
bola que empresta
Ao
ar, sincopado
Por
segundos. Vira a esquina.
Três
personagens, deles
Dois
homens e
Uma
mulher. Todos
Indecisos
pelo lugar
Onde
perder o tempo: à sombra?
Está
frio. Ao sol, sentados
No
murete da escada do prédio?
Está
ocupado por mim.
Na
esquina?
Cheira
a mijo. Ficam aí.
A
mulher fala, com a boca
Virada
para a calçada,
Enquanto
folheia
Uma
revista. Um dos homens
Protege
a esquina
Com
o seu corpo, um pé
No
chão e o outro
Na
construção. Ambas as mãos
Nos
bolsos. A mulher dobra
A
revista, enquanto não
Se
cala, e altera
Constantemente
a mão
Que
segura aquela «Quando
Estamos
a aprender, é normal»
Dizem.
Cala-se a mulher,
Continua
um homem para
O
outro em diálogo
De
todos. A mulher muda
O
sentido das madeixas
Do
seu cabelo,
Com
uma das mãos, a outra segura
A
revista. Dobra a revista,
Começa
a falar, gesticula
Na
direcção dos peitos
Dos
homens. Se cala,
Empunha
a revista
Na
página anterior, aberta
Ao
acaso. Aproxima-se
Do
fim daquela
Publicação.
Quase sem palavras,
Fotografias
de outros
Homens,
mulheres, todos
Sorriem,
imagens
De
receitas, um belo lombo
De
qualquer coisa
Que
se come. Atado
Por
cordas. Uma outra velha
Passa
pelo grupo, despercebida
Enquanto
coxeia, puxada
Por
dois cães presos
Pelas
trelas, aventura-se igualmente
Pela
faixa de rodagem. É uma
Hora
em que dá para isso,
Uma
pequena frincha
No
tempo da cidade,
Para
os que nada já
Têm
a perder, para os velhos
Audazes,
inconscientes
De
todos os vícios, os que falam
Uma
língua estrangeira,
Uma
mamã africana vestida
Com
as cores dos frutos
Verdadeiros.
Outro
dia, sopra o vento pelas bermas
O
que sobra de usado, vincado
Pela
leveza dos materiais
Que
não desaparecem. Pássaros
De
corda, prescindem das asas
Para
serem como nós, alheados
Das
nuvens, desenhando o desnível
Ruços
de vidraço.
A
folhagem motorizada
Das
árvores em diálogos de óleo,
Lubrificados
abraços a nada
Nos
intervalos da dúvida. Seguram
A
língua com uma
Das
mãos junto
À
boca, posições
De
gesso. Duas mulheres
Alinhadas
à face
De
um edifício
De
apartamentos, olham
A
estrada raramente vazia. Um veículo
Trava
a fundo, evitando
Um
mal menor, a morte
De
alguém. Que falta
Me
fazem. E disso
Não
sabem. Olham a estrada,
As
mulheres, com a calma
Das
desocupadas. Fervem
A
sopa da semana
Directamente
no estômago – lhes azedam
Os
gestos pelos quais
Comunicam,
em morse
De
maxilares quase
Imperceptíveis.
Ouvem-se,
Sobretudo
quando alguém
No
seu julgamento
Passa
mal vestido, com uma
Cor
fora do tom. Uma camisa
Fora
do seu lugar. Sopra o vento
Pelos
fios condutores, ao alto
Pelos
cordões das roupas,
Pelos
cabelos quase todos,
Pelas
árvores. Os pássaros
Aflitos
de tanto transtorno,
Ou
simplesmente desinteressados
Pelo
espaço que a eles pertence,
Sem
mistério nem engarrafamentos,
Escolhem
o solo, para aí
Se
perderem no seu tracejado
De
procura por algo
Que
os forre, por dentro, e assim
Tornar
os órgãos úteis. A ameaça
Da
chuva como pedaços de ondas
Dissidentes
do lugar de onde
Vêm.
Se liberta a luz
Do
final da tarde, para desaparecer
Por
entre o trânsito, pelo interior
De
comboios e escritórios, uma luz
Solitária,
acendida por dentro
De
um veículo, por alguém
Que
não vê o sítio
Às
coisas. Acendem-se
Os
sinais de mudança
De
direcção de um
Autocarro
que retoma
A
sua marcha na faixa
De
rodagem. Os habitantes
Da
cidade, retomam
Os
seus lugares no hábito
Dos
dias. Comprimem-se
Contra
os vidros das paragens
Dos
transportes públicos. O comboio
Parte
acima das suas cabeças, o ser
Agrupa-se
em números
De
dedos, de uma mão
Afastam-se
o indispensável
Para
que, por eles, passe
O
ar viciado. Da urbe
Pedra
em lioz, amolecida
Nos
cantos pela água que fala
Devagar.
Violentada aqui
E
ali por negativos abertos
Para
inserção de grelhas
De
ventilação, pontos de luz
E
fixações de metal
Intrusivo.
Pela sua superfície
Falo,
de muros alguns
Próximos
e de outros
Ainda
por construir. Nomes
De
fugitivos, dedos
Em
crescimento, pintados pela pressa
Da
mensagem vertical, olhos semicerrados
A
contemplar pouca coisa
Na
parede em frente. Sinal
Sonoro.
Um comboio está
Para
partir, um outro chega. Repartem
Por
eles o que resta da luz
Nas
ruas. Outra luz
Se
esgueira pela abertura
Do
túnel. Insectos sentimentais, exaustos dali
Saem com costas vergadas. Saem e
Suas
mãos vazias.
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