sábado, 12 de outubro de 2013

ESPELHO



A parede é o meu espelho, e concede-me uma imagem parada do meu corpo na sombra. À sua frente, o chão não existe quando a primeira medida é tomada na direcção da altura. O chão como alegoria de uma pele que cobre a chaga interior, todos os vazios. Até o maior abismo, a fossa mais bem escavada, têm no seu fim, um chão. A transformação a partir dele é ausência. O corpo habita a parede, que lhe sobe equilibrada pelos braços. Risca-a, parte a mão nela, silencia-se entre mais do que uma parede. O corpo é só, e sobre ele cai a opção de ser igual a outro corpo. Mantém-se sempre um gesto, mesmo que parado, quando termina o diálogo sobre superfícies. As mãos são à parte, e resistem em ser separadas do seu descanso relativo, encerrado num punho. Dentro delas, há sempre um salto fechado, pronto. A pergunta é martelada vezes sem conta, enquanto houver resistência da estrutura, na parede – Onde cair, quando já não existe pele, um chão? Falar devagar para a parede, um contorno oral proferido por mim, a partir de um semblante carregado com as perguntas às quais não quero resposta. São interrogações para o tempo decidir, e escrever na terra, à vista de todos. Soa a caminho, um qualquer que seja, a tomar. Falar devagar para a parede, um diálogo liso de enchimento, é o que separa os seus tijolos dos meus ossos. É vaidosa, ela, varia mais nas suas vestes, até azulejos com todas as cores. Eu, visto sempre pele sobre carne, às vezes chão, alguma espessura para descarnar.

Sem comentários:

Enviar um comentário