terça-feira, 22 de outubro de 2013

TOUPEIRAS


Neste buraco, cabem dois corpos calados. E um outro que queira sossego. Imaginam-se deitados, numa cama desfeita por uma canção trágica. Em que só se ouve uma voz. O coração destes corpos bate, mas não se ouve, isolado que está por carne. Longe do vento que o atraiçoa, obrigando-o a bater fora do tempo, deslocando-o para o lado errado. Os olhos são fechados, e exponenciam a escuridão que é já esta realidade. Fingem existências, um mar visto de uma varanda sem fim, como uma pele acossada pela melancolia, um barbitúrico visual aconchegante. As mãos nascidas destes corpos, coladas juntas, são encostadas num peito vestido por demasiadas roupas, longe do calor das bocas inclementes. O sol que, aqui, não chega. Todos estes corpos estão enterrados, sublimes, até ao pescoço, o suficiente para um piscar de olho cúmplice, enquanto se prolongam. Admirados sempre com o peso do céu acima deles. Deslocam-se à boleia, pelo espaço que são estes carreiros escavados fundo, na terra adormecida pelo afago destas toupeiras todas. Um corpo único, só, cegas para o amor. Só sentem carne tocada próxima, e o seu beijo é água.

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