Os
meus passos são atacadores e já nem me lembro do primeiro laço. Sei que tinha
meia de renda branca e um chapéu engraçado. Das minhas mãos saiam pombos e
unhas cortadas. A memória puxa por ela e é impossível não ter um peito estreito.
Como se o ar lento da respiração estivesse a dar tempo ao tempo dele maior,
quando ainda havia máquinas pacientes e papéis por se revelarem. Hoje o feltro
é curto, e mal absorve tanta aguadilha decidida. Não
tenho saudades de ontem, porque continuo a usar as mesmas botas. Os atilhos é
que são outros e já não precisam de animais sacrificados. O
meu altar é feito de musgo e amanhã já é outro. Corro atrás de perus com
feridas nos joelhos, em todos os sótãos. Vendem de tudo ao balcão e há sempre
um velho de barbas em aguardente, que canta candelabros. Sou cigano de memória
e engulo sapos. A garganta é uma junta de bois aclamada na ponta do ferro. Os
olhos, corrigidos à vez. As castanhas do antigamente continuam onde as deixei.
Debaixo de serapilheira, dentro do moinho abandonado à sorte de porcos famintos
de abóboras-meninas. Há chão suficiente para pregos. Não tenho idade para esta viagem
escura, mas sobram-me ruínas com corvos barulhentos e trovões de procissão. O
ar vai ficando raro. Assim aproveito canetas secas. Já não me importo pela
tinta. Basto-me com ponteiros afiados e escrevo sulcos na árvore originalmente
copiada. Das azeitonas aproveito caroços e dou-lhes outra vida. Martelo-lhes
uma pele de ouriço num tear ao acaso. Tenho um par por divisão, pois nunca sei
quando vem a vontade. A última vez que forniquei foi comigo, e a seguir fui
para o mosteiro. Era dentro de um automóvel a cair para um rio, e contei dez
voltas. Cada uma com um pouco de água benta e nada de presunção. Aproveito o
último sopro, descolo o último cartaz e é um diabo agarrado pelo rabo. Tenho
calos nas mãos de mexer em plantas carnívoras. São bonitas a chorar poemas.
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