Ouço
os pássaros. Julgo que os ouço. Se existem, estão agora nos meus ombros.
Sinto-lhes essa proximidade possível, distribuída pelo peso das suas penas, num
equilíbrio parecido com sons que saem de sítios diferentes. Quase combinados
entre eles. É a harmonia da loucura – que julgo ser esta – vincada pelos
cotovelos dos outros, enterrados no meu cadáver calmo, onde sinto tudo muito
vivo. Uma fome de formigas viajadas, sedentas da multidão que é a minha pele.
Como se fosse um abraço extenso, visto de cima para baixo, ou de onde se
queira. Ainda consigo sentir essas coisas vivas, porque as minhas entranhas
fazem-me suaves afagos atrás da testa, lembrando-me constantemente o que ontem
comi. Aperto os dentes todos, a ver se poupo minutos mal pensados, de onde
quero sair a tempo. Esta paralisia experiente, é como um gesto grave que me
estende para o mundo, aberto em dois. Chego a pensar, que poderiam ser aqueles
pássaros pesados, apanhados abaixo das asas por um inimigo doce, habituado a
separar-lhes o coração sentimental dos pulmões necessários. Que assim, os
tivesse aberto em livro para a morte da sua música, dispondo-os depois à volta
do meu silêncio. Para que eu os admirasse, antes sequer de poder abrir a boca
para o que quisesse dizer. Agora tenho a certeza que a única coisa parada aqui,
são os meus olhos secos que olham para dentro do escuro, assumido que está esse
tom como uma estação do ano, anunciada por temperaturas que já não reconheço.
Sobra-me este canto animal dos pássaros que existem mesmo, mais do que antes
julguei, e cantam todos ao mesmo tempo. Encolho os ombros.
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