Um
jardim que é como os outros, com folhas soltas que se despedem dos seus lares. Lá
existem árvores tristes com a vida dos humanos, que passam por elas, sem contar
com os ramos. Estes humanos – são homens que passam – olham a vida por baixo
das suas raízes, e são conduzidos por relógios sem pilha, parados numa hora
conveniente. Salvam-se as crianças por agora, em bolas lançadas para a estrada
movimentada que lhes passa ao lado. Quase sempre chegam ao passeio contrário,
sem o estrondo de uma vida acabada. Pagam essas bolas preços altos, por serem os
olhos das crianças. Vão rasteiras sob carroçarias infernais e veios da
transmissão de responsabilidade que é crescer. Neste jardim, há também um homem
diferente, que tem outro relógio; é de corda, e já passaram muitas noites desde
que ficou esquecido no seu bolso. É um autista tardio – e chegou depois da lei
seca – imposta pelo acaso das coisas que se intuem ser as correctas. Uma pessoa
ainda boa, no fundo do seu poço. Uma lâmina de água é o bastante, para que o
rosto seja devolvido com um brilho perdido nos olhos; a esperança de um meio líquido
onde se possa respirar. Este homem é uma continuação do seu relógio parado, e
faz por ele os movimentos certos. Passa o dia todo encostado sempre à mesma árvore
– que o apadrinhou como mais um pássaro – e acompanha um jogo de cartas que é sempre
do mesmo naipe. É uma paciência de velhos, e trazem todos eles as suas
cartas de casa. Um baralho quase todo, menos uma figura da sua rainha.
Ela
fez renúncia.
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