Acendo
um cigarro com o tempo – dele – contado. Não me faz diferença que arda mais
rápido que uma fogueira. Puxo o fumo para dentro de mim, e sinto como se tudo à
minha volta começasse, finalmente, a adquirir o movimento próprio das coisas
animadas. É uma sensação estranha, ao mesmo tempo que é uma evidência. A de que
as coisas animadas pela vida – mas são pessoas – não estão à espera que um de
nós, individualmente, lhes conte os passos, as mãos nos bolsos ou as gravatas
ajeitadas num impulso. Mexem-se. E fazem-no como um objectivo que é o delas,
pessoas, ou incutido por um anúncio mais eficaz. A um tempo de velocidade, que
é este de agora, corresponde-me um gosto de sentir o tempo parado, por entre o fumo
que me substitui o oxigénio nos pulmões. Exalta-me até, a percepção das imagens
que vão parando nos meus óculos; os vários agora que edito depois, com a minha
lentidão. Porém, nunca lhes dou os tempos que pedem apenas o suficiente, para
que se sintam animados. É mais difícil quando passam por mim a correr; aí, sou
obrigado a amputar-lhes o gesto, e a utilizar só uns segundos do seu pestanejar
de pernas, como separadores de entidades diferentes. Baralho-me. Antes eram
coisas, agora são entidades. Como se o simples passar continuado, pela minha
retina atenta, animasse também o meu coração parado, permitindo-me chegar mais
perto de um sentimento. Pois as almas, para que as vejamos como são, precisam
de lágrimas interiores, consentidas a certos espaços de tempo, pela água vital
que nos afoga o corpo quase todo. Por cima da complexidade do nosso molde,
atestado por exercícios coloridos de moléculas, acrescentamos nós este ruído
desnecessário da dúvida, que vem da nossa dificuldade em aceitar. Apenas
aceitar. Que somos, todos, um movimento magnífico.
Sem comentários:
Enviar um comentário