quarta-feira, 3 de julho de 2013

MARGINAL



Tenho a pele de um muro rugoso, que me serve com uma margem. Calço um rio apertado com mastros, uma bóia aqui e ali, e tenho dentro águas paradas, apenas escarificadas pelo vento de um fim que vem à tarde. Sempre quieto diante de um sol grande em escala, o suficiente para ser três em tamanho de um rei de pedra. Ao fundo uma linha de silhuetas, um contorno caótico de alturas, larguras e antenas. Remos serrados que flutuam numa estrada líquida, com moinhos abandonados à sua sorte. São casas vazias – só com almas – aquecidas debaixo das chapas que pousam ferrugem nas estruturas dos espaços que ainda o são. A única roupa que trago no corpo, são retalhos de uma vela que encontrei nas margens do meu calçado, esquecida por fios atirantados ao céu que cobre isto tudo. Esta vela foi estendida, antes de ser a minha vergonha, e tinha uma tinta invisível que lhe cobria um corpo com desenho de asa cortada. Vozes próximas são a minha água que fica no copo. Há um algodão que cobre o tecto do meu bolor, de passagem por luzes que se vão acendendo à minha frente. É longe para atravessar, e espero por uma armadinha que apanhe alguém do outro lado, e me devolva a esperança por caminhos. Que a noite hoje não vem, pois é guiada por outro destino, com rodas de triciclo em equilíbrio. Para outro ancoradouro que não o meu. É seco o meu beijo, e choro lábios que prendem os teus. Sou uma vírgula que nunca sabe onde estar. Um peito apertado pelas gaivotas que cabem nele, e que lá deixo pousar, antes de te dizer:
Meu barco silencioso.

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