terça-feira, 9 de julho de 2013

INSECTO SINISTRO









O mundo do meu insecto é também redondo. Um mundo com voltas infinitas, que brotam de ovos brancos, dispostos como obstáculos. Os pêlos das minhas pernas e os pêlos dele, negros também mas mais escuros, que se comparam à luz artificial do dia. Na fome que tenho todos dias, por vezes penso em aperitivos fritos, com rodelas de tomate que envolvem pedaços de queijo. É uma imagem que se forma como uma nuvem no topo de um deles, e em que, qual montanhista orgulhoso do seu cume, surge sem maldade o meu insecto. Está diminuído de antenas; tem uma só, e bem penteada. A outra, é uma refrega já passada. Ausente. Tenho fotografias dele, espalhadas por toda a casa, que ajudam a contar uma vida cheia de flores amarelas. Poses de exosqueletos – um par – que são uma armadura. Uma dança do acasalamento, com hora e lugar, capaz de deitar fora antenas.
 Será que foi o que lhe aconteceu? Penso.
O meu insecto é vaidoso, antes de ser sinistro. Pede-me colheres de sopa bem lavadas, sem gordura, onde se perde a olhar. Um costume estranho até para mim, habituado que estou a pôr alimentos na beira do prato, equilibrando assim o apetite por mais. Um insecto físico, intenso. Com braços fortes, que obrigam um corpo de larva a olhar para si próprio, antes de ser refeição. Trato bem dele, e afasto-o de luzes azuis. Desenho as suas rotinas em folhas que ele não possa comer, e estudo-lhe o movimento parado. Tento adivinhar-lhe a alma, dentro daquela cabeça tão finita. O meu insecto sinistro, que é mais do que eu alguma vez fui. E projecta uma sombra tão pequena.

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